sexta-feira, 23 de maio de 2008

Cinemática

Nossa... Desde a última vez que estive aqui, debruçando-me sobre o teclado, várias coisas mudaram... O mundo deu mais umas voltas e, como sempre, não voltou no mesmo lugar.

Percebo que certas vidas que tenho a honra de acompanhar parecem estar paradas. Eu já tinha ouvido essa expressão várias vezes, mas só agora faz algum sentido. Acho que só posso perceber isso porque estou em movimento, de uma forma que é difícil pra mim mesmo ver algum propósito ou sentido pras coisas que, aos meus olhos, parecem estar passando, como numa paisagem na janela de um trem.

Tudo bem, as coisas não, necessariamente, têm propósito ou sentido, e estou aprendendo isso aos pouquinhos. É apenas um modo de dizer o que percebo, da forma como percebo.

De qualquer forma, vejo que este movimento muito vertiginoso não me agrada muito; não é à agitação constante que pertenço. Só de dizer isso fica muito claro que, há mais ou menos um ano, eu estava acostumado com uma certa monotonia em alguns sentidos da vida. De lá pra cá - e muito espetacularmente -, as coisas têm me dado guinadas, ziguezagueando-me muito rapidamente e recuperando experiências que há muito começaram a se depositar, de fora pra dentro, num cantinho chamado desejo e num cantão chamado razão. Pensar e querer são coisas que funcionam muito bem quando devidamente encaminhadas na vida concreta, mas que não vão muito longe - não além da imaginação - quando enfurmadas na cabeça, como um museu de maravilhas fechado ao público. Daí, de vez em quando - e eu tenho tido muita sorte nesses casos -, vem uma mãozinha e nos puxa para fora de nós mesmos, nos tira de nossos próprios escombros e nos dá ar. Ar e água. E terra firme. E asas. E tombos. E chances.

Esperar coisas desses movimentos da vida é algo ora ousado, ora tolo e imprudente. A vida não é consciente, e seus próprios propósitos não nos cabem nem nos contemplam. A vida é um grande carrossel que gira muito rápido, e viver, pelo que eu posso sentir agora, é soltar de vez em quando e seguir a tangente. Mas ninguém nos vem soltar as mãos e indicar o momento. Isso é parte do viver. Isso é a nossa parte do viver.

Eu espero muito da minha vida, e muito do que lhe acontece. Mas estou aprendendo, aos poucos, que esperar é uma armadilha. Esperando, como eu já fiz, passam os anos, as datas, as pessoas, as oportunidades. Tive a sorte de encontrar correntes fortes ao meu redor, que me ajudaram a largar a revista velha que eu lia na espera e saltar na rua. Estar parado é ver a vida em movimento e não tomar parte nela.

Tenho aprendido, a duras penas, que nem tudo é se mover. Também há os momentos de se deixar levar pelo movimento vital, rodar um pouco mais à vontade no grande carrossel. E por isso digo que esperar também é apostar no colorido da vida. É dar o braço a torcer aos pequenos riachos que podem nos levar a grandes cachoeiras. É acompanhar as reticências. Há a hora de remar e a hora de deixar ao vento e à força das águas o rumo de nossos navios. Às vezes, nem de navios é preciso. Mas, somente, um barquinho de papel. Ser ousado e arriscar perder o controle por um minuto pode custar muitas coisas, tanto quanto pode trazer inúmeras outras; e, se a vida também é uma eterna troca, uma busca sem fim - ainda bem! - pela homeostase, não se pode omitir o direito de perder, assim como o direito de ganhar. É necessário um pouco de risco para se alcançar as coisas, seja o outro lado de um desfiladeiro, seja o pote de doces em cima do armário mais alto.

Porém, para todo raciocínio há uma ressalva - essa sempre perseguirá as idéias, sejam grandes ou pequenas... -, e com esse texto não será diferente. Arriscar é importante, agir com prudência também é, mas também é um ponto sensível da vida a responsabilidade. Zelar demais pode nos tornar maracujás enrugados escondidos na gaveta; ousar demais, por outro lado, torna vulnerável aos piores danos mesmo a muralha mais sólida. A vida é um bem durável apenas se cuidarmos dela. Se não for assim - e isso é muito comum -, esse direito e dever que nos é reservado torna-se um comprimido de ecstasy, que traz uma doideira incrível e deixa apenas o resto em algum tempo. Pode-se fazer qualquer coisa com a vida, mas apenas se ela estiver realmente sendo cuidada, o que implica em não fazer tudo o que a vida proporciona ou permite. Não é se acabando que vivemos.

É mais ou menos isso. Assim, experimento a vida e ela me experimenta também. Descobrimos a cada dobra um novo pedaço de vida e um novo pedaço de mim. Caí e levantei, e ainda repetirei muito esse processo. Tristezas vêm e vão, felicidades vêm e vão, e é nesse movimento que a energia flui. Como nos impulsos nervosos, como na corrente elétrica, como nas pedras do caminho, como as ondas do mar. Como nós.

Já diziam os antigos...

"Não corra atrás das borboletas; cuide do seu jardim e elas virão até você." Autor desconhecido por mim, infelizmente...
"A graça é a beleza em movimento." Gotthold Lessing, escritos e filósofo